A Marca na Parede e Outros Contos reúne alguns dos textos curtos mais significativos da obra de Virginia Woolf. Escritos entre 1917 e 1941, as histórias foram produzidas, em sua maioria, no conturbado período do entreguerras, sob o impacto de mudanças cujos ecos tiveram efeito direto na experiência sensível da escritora. Em “Uma sociedade”, a autora refuta o lugar intelectualmente inferiorizado conferido às mulheres na época; “Segunda ou terça” narra impressões do cotidiano de maneira nada óbvia; “O vestido novo” mostra ao leitor a investigação típica de Woolf acerca do sentido e forma dos fluxos de consciência. Cada um destes contos dá provas da grande qualidade literária que fez de Virginia Woolf uma das mais importantes escritoras do século XX.
TRECHOS E FRASES:
"Oh, meu Deus, o mistério da vida! A inexatidão do pensamento! A ignorância da humanidade!" - Conto: A Marca na Parede
"Porque, se quisermos comparar a vida a alguma coisa, temos de equipará-la a ser levada pelo metrô a oitenta quilômetros por hora - desembarcando no outro extremo sem um único grampo no cabelo! Lançada totalmente nua aos pés de Deus! De pernas para o ar nas campinas de asfódelos como embrulhos de papel pardo jogados, no correio, pela calha abaixo! Com o cabelo voando para trás como o rabo de um cavalo de corrida. Sim, isso parece expressar a rapidez da vida, o gasto perpétuo e a perpétua recuperação; e tão por acaso, tão a esmo..."
- Conto: A Marca na Parede
"Não haverá nada a não ser espaços de luz e escuridão, cruzados por pedúnculos grossos, e talvez bem altos, traços em forma de roseta de uma cor indistinta - rosas pálidos e azuis - que se tornarão, com o passar do tempo, mais definidos, mais - não sei o quê..."
- Conto: A Marca na Parede
"A árvore perto da janela bate de leve na vidraça... Quero pensar com calma, em paz, espaçosamente, nunca ser interrompida, nunca ter de me levantar da cadeira, deslizar à vontade de uma coisa para outra, sem nenhuma sensação de hostilidade, nem obstáculo. Quero mergulhar cada vez mais fundo, longe da superfície, com seus fatos isolados, indisputáveis. Firmar-me bem, deixar-me agarrar a primeira ideia que passa... Shakespeare... Bem, tanto faz ele ou outro. Um homem que solidamente sentou-se numa poltrona e olhou para o fogo e assim... Uma chuva de ideias caiu perpetuamente de algum Céu muito alto para atingir sua mente."
- Conto: A Marca na Parede
"Suponha-se que o espelho se despedace, que a imagem desapareça e que a figura romântica com o fundo verde da floresta a envolvê-la não esteja mais lá, mas apenas aquilo, a casca de uma pessoa que é vista por outras - que mundo raso, árido, proeminente e sem ar ela se torna! Não um mundo no qual viver."
- Conto: A Marca na Parede
"E o que é conhecimento? O que são nossos homens de saber senão descendentes de bruxas e eremitas que se acocoravam em grutas e nas matas preparando suas beberagens de ervas, interrogando musaranhos e anotando a linguagem das estrelas?"
- Conto: A Marca na Parede
"Seja como for, não faz mal ficar olhando uma marca na parede para pôr um ponto final em nossos desagradáveis pensamentos."
- Conto: A Marca na Parede
"Gosto de pensar na árvore em si: primeiro na íntima e seca sensação de ser madeira; depois na trituração pela tempestade; depois na lenta, deliciosa penetração da seiva. Gosto de pensar nisso também nas noites de inverno, quando me ergo no campo vazio com as folhas todas dobradas, fechando-me sem nada expor de sensível aos projéteis de ferro que vêm da lua, um mastro nu na terra que não para, ao longo de toda a noite, de rodopiar. O canto dos passarinhos deve soar muito alto e estranho em junho; e que frio devem sentir nos pés os insetos, quando fazem seus laboriosos avanços, subindo pelas rugas da casca, ou tomam sol sobre o toldo verde e fino das folhas, olhando reto para a frente com seus olhos vermelhos, cortados em forma de diamante... Uma a uma as fibras estalam sob a imensa pressão fria da terra e vem então o temporal mais recente e os galhos mais altos, caindo, cravam-se na terra de novo, e fundo. Nem assim a vida acaba; para uma árvore, ainda há um milhão de vidas pacientes e atentas em todo o mundo, em quartos de dormir, em barcos, no assoalho, forrando salas onde homens e mulheres sentam-se depois do chá para fumar seus cigarros."
- Conto: A Marca na Parede
"De pé na beira do canteiro de flores, o casal se mantinha imóvel, e juntos eles fizeram pressão para enfiar a ponta da sombrinha dela bem fundo na terra mole. Tal ação e o fato de ele ter a mão sobre a dela expressavam de um modo estranho seus respectivos sentimentos, como aquelas palavras curtas e insignificantes expressavam também alguma coisa, palavras com asas curtas para seu corpo tão prenhe de significados, inadequadas para levá-las longe e assim pousando desajeitadamente nos próprios objetos comuns que as circundavam e que a seu tato inexperiente eram tão maciças: mas quem sabe (desse modo pensaram eles, ao espetarem a sombrinha na terra) que precipícios não estão ocultos nelas, ou que encostas de gelo não estão brilhando ao sol do outro lado? Quem sabe? Quem já viu isso antes? Mesmo quando ela se perguntava que tipo de chá poderia ser servido em Kew, sentia ele que alguma coisa assomava por trás de suas palavras e por trás delas se mantinha, vasta e sólida; e muito lentamente a neblina se levantou revelando - oh, meu Deus -, que formas eram aquelas? - mesinhas brancas e também garçonetes que olharam primeiro para ela e depois para ele; e houve uma conta que ele pagaria com uma moeda real de dois xelins, real mesmo, totalmente real, garantia-se ele, pondo os dedos na moeda em seu bolso, real para todo mundo, a não ser para eles dois; aliás para ele já começava a parecer real; e aí - mas, sendo por demais excitante continuar de pé e pensando, ele puxou a sombrinha para fora da terra, com um safanão, e mostrou-se impaciente para achar o lugar em que se tomava chá em companhia dos outros, como os outros."
- Conto: Kew Gardens
"A fala é uma rede velha e rasgada, pela qual os peixes escapam quando é jogada neles. O silêncio talvez seja melhor. Venha até a janela, vamos tentar."
- Conto: Noite de Festa
"Coisa estranha é o silêncio. A mente se torna como uma noite sem estrelas; mas de repente um meteoro desliza, esplêndido, atravessando a escuridão, e se extingue. Por essa diversão, nunca dizemos suficientemente obrigado."
- Conto: Noite de Festa
"Pense bem a esse respeito, a literatura é o registro do nosso descontentamento."
- Conto: Noite de Festa
"Nossa insígnia de superioridade, nossa ambição de honrarias. Você há de admitir que gosta mais das pessoas descontentes."
- Conto: Noite de Festa
"É fácil confessar nossos erros. Mas que escuridão é tão fechada para ocultar nossas virtudes?"
- Conto: Noite de Festa
"... após examinar por um momento o vidro, como que em hesitação, o enfiara no bolso. Tal impulso poderia também ter sido o impulso que leva uma criança a apanhar uma pedrinha num caminho no qual elas se esparramam, prometendo-lhe uma vida em segurança e quentura sobre a lareira do quarto, deleitando-se com a sensação de poder e benignidade que uma ação como essa propicia e acreditando que o coração da pedra pula de alegria quando se vê escolhido, dentre um milhão de iguais, para gozar de tal felicidade, não de uma vida de umidade e frio na estrada."
- Conto: Objetos Sólidos
"Fascinado pelo contraste entre a porcelana, tão vívida e alerta, e o vidro, tão contemplativo e calado, ele se perguntou, pasmo e perplexo, como os dois tinham vindo a existir no mesmo mundo, para plantar-se, além do mais, no mesmo cômodo, na mesma estreita faixa de mármore. Mas a pergunta permaneceu sem resposta."
- Conto: Objetos Sólidos
"A vida é o que você vê nos olhos dos outros; a vida é o que as pessoas aprendem e, tendo aprendido, nunca, embora o tentem esconder, deixam de estar conscientes de - do quê? De que a vida é assim, ao que parece."
- Conto: Um Romance Não Escrito
"Contra a vida, nada melhor do que dobrar o jornal para fazê-lo um quadrado crespo, grosso, perfeito, impérvio até à própria vida."
- Conto: Um Romance Não Escrito
"Eles chegam mais perto; param na estrada. O vento sopra, a chuva escorre prateada no vidro. Nossos olhos se toldam; não ouvimos passos ao lado; não vemos mulher alguma abrindo sua fantasmal vestimenta. Já ele protege o lampião com as mãos. "Olhe só", sussurra. "Dormem a fundo. Com amor nos lábios."
Dobrando-se, mantendo acima de nós seu lampião de prata, longa e profundamente eles olham. Longa é a pausa que fazem. O vento impele certeiro; a flama enverga fragilmente. Fachos fortes de luar cruzam pelo chão e a parede e, ao se encontrarem, mancham as faces que se dobram; as faces que ponderam; as faces que revistam os dormentes e buscam sua oculta alegria."
- Conto: Casa Assombrada
- Conto: Casa Assombrada
"... que o objetivo da vida é formar boas pessoas e produzir bons livros [...] Um bom homem deve ao menos ser honesto, apaixonado e desinteresseiro."
- Conto: Uma Sociedade
"Como é bela a bondade em quem, pisando de leve, passa sorrindo pelo mundo."
- Conto: O Quarteto de Cordas
"Aproxima-se a noite, e o verde, varrido pela sombra, vai para cima da lareira; a superfície enrugada do oceano. Não há navios chegando; as ondas a esmo balançam sob o céu vazio. A noite avança; das agulhas agora pingam traços de azul. O verde ficou de fora."
- Conto: Azul e Verde
"Ah, que trágica essa ganância, esse clamor de seres humanos que, como um bando de cormorões, batem asas e berram a pedir simpatia - era trágica, caso se pudesse realmente sentir, e não apenas fingir que se sentia tal coisa!"
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