Nos quase vinte anos à frente de uma Vara de Família, Andréa Pachá — a partir da observação dos conflitos dos tribunais e da necessidade de compreender o fenômeno que levava os casais, muitas vezes, ao limite do ódio e da intolerância — resolveu contar histórias capazes de traduzir nossa dificuldade para lidar com o desamparo e com as frustrações. O resultado foi A vida não é justa, originalmente publicado em 2012, que, relançado agora pela Intrínseca, conta com nova capa e novo projeto gráfico, além de apresentação da autora contextualizando a obra.
Ao narrar casos de separações, guarda dos filhos, partilhas de bens, paternidade, histórias de amor, reencontros e desencontros, a obra explora situações em que é difícil definir o responsável: o que sentem os casais que testemunham, impotentes, o fim da pró pria relação; como partilhar os bens quando não há mais amor para ser dividido; é possível tentar mais uma vez depois que a confiança, antes tão firme, parece escorrer por entre os dedos?
TRECHOS E FRASES:
"O amor nunca acaba de uma hora para outra. Vai gastando, lentamente, no tempo arbitrário da vida."
"A vida tem múltiplos caminhos e diversas possibilidades. O ritual do luto era necessário para seguir adiante."
"A vida nunca é um porto seguro..."
"... reflexo de uma geração forjada no espetáculo e no consumo e também rasa nas manifestações de afeto, desprovida de densidade."
"Aprendeu, então, a sofrer sozinha e resignada."
"Perguntava em silêncio. Respondia em silêncio. Concluía em silêncio. Esquecera que é dos silêncios profundos que se alimenta a angústia."
"Pior do que o estado da vítima é o julgamento fácil das pessoas próximas. Mesmo sem intenção, elas acabam por transferir para o deprimido a culpa pela doença, como se, num processo depressivo, alguém fosse capaz de reagir e mudar o rumo da vida. Como se, ao entrar naquele buraco escuro e sem fim, a pessoa o tivesse feito por vontade própria. Deve ser a dificuldade de olhar nos olhos da tristeza. Ninguém tem o direito de fazer o outro infeliz com suas angústias, principalmente numa sociedade que tenta blindar qualquer contrariedade, limitação ou dor."
"E porque a vida é o que se escolhe e não o que deveria ter sido feito."
"O afeto é definitivo. A saudade, diária. O agradecimento, eterno."
"Sempre tive um olhar superlativo para enxergar o cotidiano. Comprar um pão, abastecer o carro, andar de táxi, tudo se transformava em história diante de uma retina viciada em romancear a realidade."
"Toda dor sepultada no silêncio cria raízes profundas. Ainda que permaneça embaixo da terra durante algum tempo, um dia, de repente, brota devastando a superfície ao redor."
"E porque a vida não é justa e muitas vezes interrompe, num ponto final arbitrário, a estrada antes do fim..."